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A obrigatoriedade de concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução
Autores: Mateus Santos SalgadoPublicado no site em: 27 de outubro de 2016
O CPC (lei Federal 13.105/15) manteve em seu artigo 525, §6º a alteração proposta la lei 11.382/06 que incluiu o art. 739-A no CPC/73.
O referido artigo 739-A alterou o disposto no CPC/73 e passou a indicar que os embargos à execução opostos pelo devedor não possuiriam, em regra, efeito suspensivo, sendo que caberia ao juiz, observando o fumu boni iuris e o periculum in mora, além da garantia do juízo atribuir à peça defensiva efeito suspensivo e, portanto, paralisar a execução fiscal.
O CPC/15, como já mencionado, manteve a alteração formulada em 2006, a qual passou a atribuir o efeito suspensivo aos embargos opostos somente após a apreciação do magistrado a respeito da necessidade de dano de difícil reparação. Vejamos:
Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.
(...)
§ 6o A apresentação de impugnação não impede a prática dos atos executivos, inclusive os de expropriação, podendo o juiz, a requerimento do executado e desde que garantido o juízo com penhora, caução ou depósito suficientes, atribuir-lhe efeito suspensivo, se seus fundamentos forem relevantes e se o prosseguimento da execução for manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação. (destaques adicionais)
Com as alterações sofridas pelo CPC, passou-se a indagar qual seria os efeitos da não obrigatoriedade de concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução fiscal opostos nos termos da lei 6.830/80 (lei de Execuções Fiscais), haja vista que determinada legislação não possui menção expressa a concessão ou não de efeitos suspensivos aos embargos opostos pelo executado.
Parte da doutrina entende que o CPC, norma geral processualista, transfere ao processo executivo fiscal suas normas, sendo que os embargos à execução fiscal não possuiriam efeito suspensivo obrigatório, pois o art. 525, §6º do CPC indica que somente após a análise do magistrado do fumu boni iuris e do periculum in mora é que poderia ser determinada a suspensão da execução fiscal.
Nesta linha, José Carneiro da Cunha preleciona:
"A lei 6.830/80 não trata dos efeitos decorrentes da propositura dos embargos o executado. Incidem, diante disso, as novas regras contidas no CPC. Significa, então, que, ajuizados os embargos, a execução fiscal não estará, automaticamente, suspensa. Os embargos não suspendem mais a execução fiscal, cabendo ao juiz, diante de requerimento do executado e convencendo-se da relevância do argumento e do risco de dano, atribuir aos embargos o efeito suspensivo. Em outras palavras, a execução fiscal passará a ser suspensa, não com a propositura dos embargos, mas sim com a determinação judicial de que os embargos merecem, no caso concreto, ser recebidos com efeito suspensivo." (destaques adicionais)
A jurisprudência, por sua vez, passou a aplicar o disposto no CPC às execuções fiscais, sendo que referido posicionamento fora sedimentado pelo STJ no julgamento do REsp 1.272.827/PE sob o rito dos recursos representativos de controvérsia, nos termos do artigo 543-C do CPC/73 (atual artigo 1.036 do CPC/15).
No julgamento do apelo especial interposto pela Fazenda Nacional, o Ministro Mauro Campbell Marques realizou breve relato histórico a respeito da evolução legislativa para, ao final, dar provimento ao recurso fazendário com a indicação de que os embargos à execução fiscal não possuem obrigatoriamente efeito suspensivo, aplicando-se, por consequência, o disposto no então art. 739-A do CPC/73 (atual artigo 1.036 do CPC/15). Senão vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. APLICABILIDADE DO ART. 739-A, §1º, DO CPC ÀS EXECUÇÕES FISCAIS. NECESSIDADE DE GARANTIA DA EXECUÇÃO E ANÁLISE DO JUIZ A RESPEITO DA RELEVÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO (FUMUS BONI JURIS) E DA OCORRÊNCIA DE GRAVE DANO DE DIFÍCIL OU INCERTA REPARAÇÃO (PERICULUM IN MORA) PARA A CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AOS EMBARGOS DO DEVEDOR OPOSTOS EM EXECUÇÃO FISCAL.
1. A previsão no ordenamento jurídico pátrio da regra geral de atribuição de efeito suspensivo aos embargos do devedor somente ocorreu com o advento da lei 8.953/94, que promoveu a reforma do Processo de Execução do CPC/73 (lei 5.869/73 - CPC/73), nele incluindo o §1º do art. 739, e o inciso I do art. 791.
2. Antes dessa reforma, e inclusive na vigência do decreto-lei 960/38, que disciplinava a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública em todo o território nacional, e do CPC/39 (decreto-lei 1.608/39), nenhuma lei previa expressamente a atribuição, em regra, de efeitos suspensivos aos embargos do devedor, somente admitindo-os excepcionalmente. Em razão disso, o efeito suspensivo derivava de construção doutrinária que, posteriormente, quando suficientemente amadurecida, culminou no projeto que foi convertido na citada lei 8.953/94, conforme o evidencia sua Exposição de Motivos - Mensagem n. 237, de 7 de maio de 1993, DOU de 12.4.1994, Seção II, p. 1696.
3. Sendo assim, resta evidente o equívoco da premissa de que a LEF e a lei 8.212/91 adotaram a postura suspensiva dos embargos do devedor antes mesmo de essa postura ter sido adotada expressamente pelo próprio CPC/73, com o advento da lei 8.953/94, fazendo tábula rasa da história legislativa.
4. Desta feita, à luz de uma interpretação histórica e dos princípios que nortearam as várias reformas nos feitos executivos da Fazenda Pública e no próprio Código de Processo Civil de 1973, mormente a eficácia material do feito executivo a primazia do crédito público sobre o privado e a especialidade das execuções fiscais, é ilógico concluir que a lei 6.830/80- lei de Execuções Fiscais - LEF e o art. 53, §4º da lei 8.212/91, foram em algum momento ou são incompatíveis com a ausência de efeito suspensivo aos embargos do devedor. Isto porque quanto ao regime dos embargos do devedor invocavam - com derrogações específicas sempre no sentido de dar maiores garantias ao crédito público - a aplicação subsidiária do disposto no CPC/73 que tinha redação dúbia a respeito, admitindo diversas interpretações doutrinárias.
5. Desse modo, tanto a lei 6.830/80 - LEF quanto o art. 53, §4º da lei 8.212/91 não fizeram a opção por um ou outro regime, isto é, são compatíveis com a atribuição de efeito suspensivo ou não aos embargos do devedor. Por essa razão, não se incompatibilizam com o art. 739-A do CPC/73 (introduzido pela lei 11.382/06) que condiciona a atribuição de efeitos suspensivos aos embargos do devedor ao cumprimento de três requisitos: apresentação de garantia; verificação pelo juiz da relevância da fundamentação (fumus boni juris) e perigo de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora).
6. Em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/73, a nova redação do art. 736, do CPC dada pela lei 11.382/06 - artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos - não se aplica às execuções fiscais diante da presença de dispositivo específico, qual seja o art. 16, §1º da lei 6.830/80, que exige expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal.
7. Muito embora por fundamentos variados - ora fazendo uso da interpretação sistemática da LEF e do CPC/73, ora trilhando o inovador caminho da teoria do "Diálogo das Fontes", ora utilizando-se de interpretação histórica dos dispositivos (o que se faz agora) - essa conclusão tem sido a alcançada pela jurisprudência predominante, conforme ressoam os seguintes precedentes de ambas as Turmas deste Superior Tribunal de Justiça. Pela Primeira Turma: AgRg no Ag 1381229/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 15.12.2011; AgRg no REsp 1.225.406/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 15.2.2011; AgRg no REsp 1.150.534/MG, Primeira Turma, rel. min. Benedito Gonçalves, julgado em 16.11.2010; AgRg no Ag 1.337.891/SC, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 16.11.2010; AgRg no REsp 1.103.465/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 07.05.2009. Pela Segunda Turma: AgRg nos EDcl no Ag n.1.389.866/PR, Segunda Turma, Rei. Min. Humberto Martins,DJe de 21.9.2011; REsp, n. 1.195.977/RS, Segunda Turma, Rei. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/08/2010; AgRg no Ag n. 1.180.395/AL, Segunda Turma, Rei. Min. Castro Meira, DJe 26.2.2010; REsp, n, 1.127.353/SC, Segunda Turma, Rei. Min. Eliana Calmon, DJe 20.11.2009; REsp, 1.024.128/PR, Segunda Turma, Rei. Min.
Herman Benjamin, DJe de 19.12.08.
8. Superada a linha jurisprudencial em sentido contrário inaugurada pelo REsp. n. 1.178.883 - MG, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 20.10.2011 e seguida pelo AgRg no REsp 1.283.416/AL, Primeira Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 02.02.2012; e pelo REsp 1.291.923/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 01.12.2011.
9. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008. (REsp 1272827/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/05/2013, DJe 31/05/2013, destaques adicionais)2
Muito embora o STJ tenha sedimentado o posicionamento de que o efeito suspensivo somente poderá ser atribuído aos embargos à execução fiscal se preenchidos os três requisitos indicados no atual art. 525, §6º do CPC, entendemos que referido posicionamento viola o disposto na lei de Execuções Fiscais.
A lei 6.830/80 regula o processo executório fiscal, sendo, portanto, legislação especial na qual será somente aplicável o Código de Processo Civil de maneira subsidiária (vide art. 1º da lei 6.830/80).
O referido dispositivo se mostra, ao bem da verdade, redundante haja vista que a aplicação de lei especial em detrimento à norma geral processual é regra no ordenamento jurídico brasileiro.
Assim, a aplicação subsidiária de qualquer norma geral deve obrigatoriamente respeitar as peculiaridades da lei especial, sob pena de produzir um resultado que venha a subverter o ordenamento jurídico e aplique uma regra subvertida de subsidiariedade, a qual na verdade contrariará a essência do subsistema especializado.
Neste turno, válido o ensinamento de Norberto Bobbio expostos por André Folloni em artigo intitulado "Embargos à execução fiscal, necessidade de penhora e efeitos do recebimento: relações entre a lei 11.382 e lei 6.830)3:
"A lei especial é aquela que anula uma lei mais geral, ou que subtrai de uma norma parte da sua matéria para submetê-la a uma regulamentação diferente (contrária ou contraditória). A passagem de uma regra mais extensa (que abrange um certo genus) para uma regra derrogatória menos extensa (que abrange uma species do genus) corresponde a uma exigência fundamental de justiça, compreendida pelo tratamento igual das pessoas que pertencem à mesma categoria. A passagem da regra geral à regra especial corresponde a um processo natural de diferenciação das categorias, e a uma descoberta gradual, por parte do legislador, dessa diferenciação. Verificada ou descoberta a diferenciação, a persistência da regra geral importaria tratamento igual de pessoas que pertencem a categorias diferentes, e, portanto, numa injustiça. Nesse processo de gradual especialização, operado através de leis especiais, encontramos uma das regras fundamentais da justiça, que é a do suum cuique tribuere (dar a cada um o que é seu). Entende-se, portanto, por que a lei especial deve prevalecer sobre a lei geral: ela representa um momento ineliminável do desenvolvimento de um ordenamento. Bloquear a lei especial frente à geral significaria paralisar esse desenvolvimento." (destaques adicionais)
Muito embora a LEF não indique de maneira expressa que os embargos à execução opostos pelo executado possuam efeito suspensivo, ao se realizar uma intepretação sistemática da legislação especial, chega-se à conclusão de que os referidos embargos possuem efeito suspensivo obrigatório, sendo, portanto, necessária a suspensão da execução fiscal ajuizada pela Fazenda Pública até o julgamento da medida defensiva aventada pelo executado.
Neste interim, veja-se que pela disposição dos artigos 19, 24, I e 32 § 2º, todos da LEF, os embargos do devedor continuam a suspender a execução, não havendo que se falar em aplicação subsidiária do CPC.
O artigo 19, no caso de garantia prestada por terceiro a execução só prosseguirá caso os embargos sejam rejeitados ou caso não sejam ajuizados. O fato de a Fazenda Pública só poder adjudicar os bens penhorados, antes do leilão, caso a execução não seja embargada ou se os embargos forem rejeitados (artigo 24, I) e o fato de o depósito, monetariamente atualizado, só ser devolvido ao depositante ou entregue à Fazenda Pública após o trânsito em julgado da decisão dos embargos do devedor (§ 2º do artigo 32) indicam de maneira cristalina que os embargos opostos pelo executado suspendem o curso da execução fiscal.
Neste sentido, assevera Hugo de Brito Machado que o efeito suspensivo dos embargos, no âmbito das execuções fiscais, acolhido pela doutrina e pela jurisprudência, decorre dos artigos dispostos em lei específica e que indicam de maneira implícita a concessão de efeitos suspensivos aos embargos. Jamais da aplicação subsidiária do CPC4.
A aplicação da lei de Execuções Fiscais no que tange a concessão de efeito suspensivo aos embargos opostos em detrimento do disposto no CPC já fora defendido pelo STJ. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. EFEITO SUSPENSIVO. NÃO-INCIDÊNCIA DO ART. 739-A DO CPC. NORMA DE APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA À LEI 6.830/80. INTELIGÊNCIA DE SEU ART. 1º INTERPRETADO EM CONJUNTO COM OS ARTIGOS 18, 19, 24 E 32 DA LEF E 151, DO CTN.
1. Controvérsia que abrange a discussão sobre a aplicabilidade do art. 739-A e § 1º, do CPC, alterados pela lei 11.382/06, às execuções fiscais.
2. A lei 6.830/80 é norma especial em relação ao CPC, de sorte que, em conformidade com as regras gerais de interpretação, havendo qualquer conflito ou antinomia entre ambas, prevalece a norma especial. Justamente em razão da especialidade de uma norma (LEF) em relação à outra (CPC), é que aquela dispõe expressamente, em seu artigo 1º, que admitirá a aplicação desta apenas de forma subsidiária aos procedimentos executivos fiscais, de sorte que as regras do CPC serão utilizadas nas execuções fiscais apenas nas hipóteses em que a solução não possa decorrer da interpretação e aplicação da norma especial.
3. O regime da lei de execução fiscal difere da execução de títulos extrajudiciais, pois regula o procedimento executivo de débitos inscritos na dívida ativa, ou seja, constantes de títulos constituídos de forma unilateral.
4. A interpretação dos artigos 18, 19, 24, inciso I, e 32, § 2º, da LEF leva à conclusão de que o efeito suspensivo dos embargos à execução fiscal decorre da sua apresentação. Isso porque tais dispositivos legais preveem a realização de procedimentos tendentes à satisfação do crédito (manifestação sobre a garantia, remissão, pagamento, adjudicação, conversão de depósito em renda) apenas após o julgamento dos embargos ou nas hipóteses em que estes não sejam oferecidos, evidenciando a suspensão do prosseguimento da execução até o julgamento final dos embargos.
5. Ainda a evidenciar o regime diferenciado da execução fiscal e o efeito suspensivo inerente aos embargos que se lhe opõem, está o § 1º do artigo 16 da lei 6.830/80, segundo o qual "não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução", o que denota a incompatibilidade com as inovações do CPC quanto ao efeito suspensivo dos embargos à execução.
6. Recurso especial provido.
(REsp 1291923/PR, Rel. ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 1/12/11, DJe 7/12/11, destaques adicionais)5
Ainda, a LEF dispõe que a oposição de embargos à execução fiscal deve ser, obrigatoriamente, precedida de garantia do juízo, nos termos do art. 16. Assim, em uma análise conjunta, tem-se que o crédito tributário está com sua exigibilidade suspensa, nos termos do art. 151, II, do Código Tributário Nacional, fato este que já demonstraria a impossibilidade de prosseguimento da execução fiscal.
Desta feita, estando o crédito tributário com sua exigibilidade suspensa, mister o reconhecimento da suspensão da execução fiscal. Não se mostra razoável e proporcional a continuidade da demanda executiva com a garantia do juízo por afronta ao indigitado dispositivo.
A garantia do juízo já é necessária e suficiente para a suspensão da execução fiscal. A verificação do periculum in mora e do fumus boni iuris se mostra desnecessária, ainda mais porque o processo executivo com a possibilidade de constrição patrimonial já se mostra deveras prejudicial ao contribuinte.
Assim, o periculum in mora já se evidencia pela prejudicialidade do processo executivo e a possibilidade de lesão indevida ao contribuinte. Já o fumu boni iuris não se mostra adequada para a suspensão da execução fiscal, haja vista que que o prosseguimento dos embargos é fase cognitiva, não sendo possível verificar de plano possíveis irregularidades no ato fazendário de cobrança do crédito.
Assim, diante da especificidade da lei executiva, bem como pela garantia do juízo para a oposição dos embargos, torna-se mister o reconhecimento de que opostos os embargos à execução fiscal, a demanda executiva se suspende até o julgamento em definitivo da peça defensiva proposta pelo contribuinte.
Nesta esteira, concordamos com a posição vencida do STJ, ou seja, de que a LEF se apresenta como lei específica e, portanto, aplicável às execuções fiscais em detrimento do disposto no CPC. Entendemos, ainda, que a aplicação do CPC às demandas executivas propostas pelas Fazenda Públicas e a não concessão de efeito suspensivo aos embargos opostos de maneira automática, também viola princípios constitucionais.
Segundo Hugo de Brito Machado negar os efeitos suspensivos aos embargos à execução fiscal significa negar o direito à jurisdição efetiva, expressamente assegurada pela Constituição Federal em seu artigo 5º, XXXV, ao estabelecer que a lei "não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça ao direito"6.
Os embargos, muito embora possuem autonomia do ponto de vista formal, na verdade constituem uma fase da execução fiscal, na qual o Estado exerce a jurisdição cognitiva, ou seja, toma conhecimento das alegações do contribuinte e resolve a lide instaurada. Assim, caso os embargos não tenham efeito suspensivo há a possibilidade de restarem inúteis, uma vez que o andamento da execução fiscal poderá acarretar graves prejuízos ao contribuinte, inclusive pela possibilidade de aperfeiçoamento de alienação patrimonial.
Igualmente, tem-se afronta ao princípio da razoabilidade. O Direito é fruto e instrumento da racionalidade humana. Fruto porque decorre e, instrumento porque se presta para realizar a solução racional dos conflitos entre os humanos.
O princípio da razoabilidade é uma diretriz da razão humana, ou seja, havendo o seu prestigio não está voltando ao racionalismo jurídico, mas de certa forma se está reconhecendo suas virtudes, posto que preconiza a interpretação das leis conducente a soluções racionais. O princípio, portanto, funciona como um critério a orientar a escolha de uma interpretação, entre as várias que compõe o quadro ou moldura de interpretações possíveis.
Tem-se, assim, como razoável e justo a suspensão da execução fiscal em face da oposição de embargos à execução pelo contribuinte, uma vez que se mostra necessária para a melhor realização do princípio da justiça.
Destaca-se, que muito embora haja a discordância com o entendimento do STJ no que se refere a não suspensão da execução fiscal em face dos embargos à execução, entende-se como acertado posicionamento adotado pela suspensão da execução na iminência de aperfeiçoamento da constrição patrimonial do devedor, nos casos em que os embargos estão pendentes de julgamento.
Muito embora a execução fiscal venha a ser suspensa na iminência da realização de hasta pública para leilão de bem penhorado, entende-se que a Fazenda Pública em nenhum momento estaria prejudicada caso a execução fiscal se suspendesse em momento anterior.
Nota-se que o prosseguimento da execução até a realização de leilão ainda assim acarreta ao contribuinte prejuízos que poderiam ser evitados. Neste interim, tem-se que o argumento de que estaria a acelerar o processo executivo e a satisfação do interesse público também não merecem prosperar, uma vez que não se mostra razoável cumprir com o interesse público a todo custo, mesmo que para isso venha a se afrontar princípios constitucionalmente previstos.
Portanto, diante do quanto exposto tem-se que, data máxima vênia, mostra-se equivocada o posicionamento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça pelos seguintes argumentos:
- não se considerou a especificidade da lei de Execuções Fiscais e sua aplicação em detrimento do CPC, o qual somente é aplicada de maneira subsidiária às execuções fiscais (vide art. 1º, da LEF);
- diante da especificidade da LEF e sua análise sistemática, tem-se que referida legislação é cristalina ao indicar que os embargos à execução fiscal possuem efeitos suspensivos;
- a não suspensão da execução fiscal em face da oposição dos embargos à execução fiscal afronta princípios constitucionais, tais como o do acesso à justiça e da razoabilidade, uma vez que se mostra inadequada o prosseguimento da execução em face de procedimento cognitivo dos embargos;
Vislumbra-se, assim, com a possibilidade de o STJ rever o seu posicionamento e retornar ao entendimento exarado no ano de 2011 quando do julgamento do REsp n. 1.291.923/PR, haja vista que a suspensão da execução fiscal em face da oposição de embargos à execução fiscal se mostra acertada por respeito à legislação vigente, bem como pelos preceitos constitucionais previstos na CF. « Voltar