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O princípio da inafastabilidade da jurisdição e o ombudsman bancário

Autor: Alex de Siqueira
Publicado no site em: 29 de setembro

A figura do Ombudsman surgiu em 1809 na Suécia, como órgão de controle parlamentar, cuja finalidade é representar os interesses dos cidadãos frente às instituições públicas, para que estas agissem conforme as leis. No Brasil, resumidamente, esta figura foi trazida pela Constituição Federal, onde previu o instituto da Defensoria Pública, Advocacia Pública, Ministério Público e Advocacia Privada.

Atualmente o STJ em parceria com a Federação Brasileira de Bancos (Febrabam), está realizando seminários acerca do Ombudsman bancário, como forma de desafogar o poder judiciário com as inúmeras demandas que envolvem os bancos.1

Como funciona na Alemanha, a proposta é que o consumidor faça uma reclamação por escrito ao Ombudsman, e este elabore um parecer favorável ou não com relação ao conflito bancário. Desta forma, assim como já explicado pelo ministro Paulo de Tarso Sanseverino, caso o parecer seja desfavorável ao cliente, este poderá demandar judicialmente. Essa é uma ideia importante no conceito de desjudicialização, conforme explica o Ministro Sidnei Beneti2, eis que são inúmeras demandas no poder judiciário que tratam de assuntos bancários e que demoram tempo para serem solucionadas.

Ocorre que nosso sistema constitucional prevê o princípio da inafastabilidade da jurisdição disposto no art. 5º inciso XXXV, o qual determina que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Esse conceito direto foi criado após a promulgação da Constituição Federal de 1988 que passa garantir de forma expressa, a proteção de direitos, sejam eles públicos, privados ou até mesmo transindividuiais.3

O referido princípio não se trata apenas de garantir o direito a acesso ao poder judiciário com relação aos organismos já existentes, mas sim de uma ordem jurídica justa. Inclusive, garante a tutela jurisdicional repressiva quanto à preventiva, em razão da disposição quanto a “lesão” e “ameaça a direito”.4 Inclusive, a inafastabilidade da jurisdição veda que no sistema constitucional seja admitida a jurisdição condicionada, conforme previa a Constituição de 1969.5

Portanto, é necessário interpretar o referido princípio para evitar que a figura do Ombudsman bancário seja aplicada de forma equivocada e não tenha sua real eficácia, tendo em vista que a condição de acesso à justiça ou instância administrativa de curso forçado é vedada pela Constituição Federal, e muitos magistrados afastam as alegações de falta de interesse de agir por conta deste princípio.

Deve-se analisar o instituto sobre a própria ótica de justiça e afastar futuras conclusões sobre a inafastabilidade da jurisdição, eis que a figura do Ombudsman bancário não servirá para impedir o acesso à justiça, mas sim trazer benefício à ordem jurídica e inclusive aos consumidores. A celeridade de resolução de conflitos será maior, reduzirá os inúmeros processos que tramitam no poder judiciário e que impedem que os processos que realmente dependem de solução jurisdicional sejam julgados com mais rapidez. É basicamente uma garantia de solução de conflitos justa e mais célere.

Contudo, é natural que os consumidores, em razão da complexidade das demandas que tratam os assuntos bancários, busquem a proteção de seus direitos no poder judiciário, pois amparados por seus advogados sentem-se mais seguros na garantia de seus direitos. No entanto, também é de ordem natural que após evidenciada certa eficácia e estabilidade no ombudsman bancário, estes consumidores se sintam atraídos com o novo instituto.

Portanto, caso a implementação deste instituto na área bancária tenha sua real finalidade atingida, e sua prática demonstre aos consumidores efetivamente a garantia de seus direitos, não haverá necessidade de confrontar o princípio da inafastabilidade da jurisdição para a redução de demandas, pois os consumidores sentiram-se atraídos pela facilidade na resolução de conflitos e consequentemente os números de demandas ajuizadas reduzirão.

Assim, conclui-se que é necessário o acesso à justiça alternativa como garantia dos direitos dos cidadãos, tão eficaz quanto o poder judiciário. Não se pode planejar um meio de redução de demandas, somente para este fim, sem que o sistema em si tenha eficácia. Para que isso ocorra é imperioso o esforço de todos, seja do consumidor para que busque o meio alternativo de garantir seus direitos, da própria figura do Ombudsman em elaborar seus pareceres, e do próprio poder judiciário que deve aplicar a lei com imparcialidade, objetivando a julgar de forma que não incentive o consumidor a procurá-lo como forma de obter para si proveito maior do que a própria reparação de seus danos.
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